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Familiares de vítimas da violência policial cobram justiça

Familiares de vítimas da violência policial cobram justiça

Por Gustavo Souza

Publicado em 30/03/2023 às 15:45

Coletivos de mães de jovens negros participaram de debate na Câmara

Por: Agência Brasil

Na semana que marca os 59 anos do golpe de Estado de 1964, a Coalizão Brasil por Memória, Verdade, Justiça, Reparação e Democracia reuniu mães e familiares de vítimas da violência policial ao longo dos últimos anos em um debate na Câmara dos Deputados, em Brasília, na tarde desta terça-feira (28). O evento foi marcado pela comoção das pessoas que seguem sofrendo na pele a ação brutal das forças de segurança do Estado, mesmo décadas após o fim do regime autoritário no país.

É o caso de Bruna Cristina de Melo Mozer, mãe de Marcos Luciano Mozer de Sousa, que morreu aos 14 anos durante uma operação policial no Complexo de Favelas da Maré, zona norte do Rio de Janeiro, há quase cinco anos. Na época, o caso ganhou grande repercussão nacional, mas até hoje não houve justiça. Naquele momento, em 2018, o Rio de Janeiro sofria uma intervenção federal na área de segurança pública, com participação das Forças Armadas.

“Meu filho foi morto aos 14 anos e [antes de morrer] me fez uma pergunta: ‘Mãe, pelo amor de Deus, o que eu fiz? Eles não me viram com roupa e material de escola?'”, relembra.

“Mesmo que não tivesse com roupa e material de escola, qual é o problema? O papel do Estado não é entrar para matar. A gente precisa de saneamento básico, de uma luz, de um relógio [de água]”, protesta Bruna, uma das fundadoras do Coletivo Mães da Maré, que atua em defesa dos direitos humanos na favela e por memória, justiça e reparação.

“O Estado mata uma família inteira porque adoece [as mulheres], as mães vêm morrendo. A gente se joga na luta não é por estrelismo, mas para não morrer mesmo”, acrescenta.

“Todos os filhos assassinados pelo Estado estão presentes na nossa voz, que não se cala, e vamos lutar por justiça”, bradou Ana Paula de Oliveira, fundadora do Coletivo Mães de Manguinhos. Ela também é mãe de uma vítima, o jovem Johnatha de Oliveira Lima, morto em Manguinhos, favela do Rio de Janeiro, em 2014, por um policial da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Na época, ele tinha 19 anos.

Luta atualizada
Um dos pontos do debate desta terça, no contexto de memória sobre as violações durante a ditadura militar, é justamente transpor essa luta para as vítimas atuais de violência do Estado, marcadamente populações periféricas das grandes cidades, especialmente a juventude negra que vive nessas áreas.

“O tema da ditadura é algo de penetração muito difícil na sociedade brasileira. Historicamente, as pessoas do presente têm dificuldade de se conectar. É por isso que principal ganho para essa luta por memória, verdade e justiça e reparação é quando incorporamos os novos agentes dessa luta, que são essas vítimas da violência policial”, argumenta Gabrielle Abreu, coordenadora da área de memória, verdade e justiça do Instituto Vladimir Herzog e integrante da direção executiva da Coalizão.

Para Abreu, a falta de uma verdadeira justiça de transição no país, após o fim do regime militar, é um dos fatores que mais contribuem para a reiteração dessa violência. “A falta de cuidado, naquele momento, acaba refletindo hoje num certo aperfeiçoamento da maneira como, por exemplo, as polícias agem nas periferias e favelas brasileiras, uma cultura de impunidade que a ditadura não inaugura, mas acaba consolidando”.